Na tarde de quarta, 15 de outubro, o Sinasefe Santa Maria promoveu um espaço para avaliação do conteúdo do projeto de Reforma Administrativa que foi divulgado até o momento. As modificações na estrutura do serviço público em todos os níveis têm sido divulgadas pelo relator do Grupo de Trabalho (GT), deputado Pedro Paulo (PSD-RJ).
Para a coordenadora-geral da seção sindical, Claudia do Amaral, esse tipo de iniciativa é fundamental para dialogar com sindicalizados e sindicalizadas e com a totalidade dos que integram a carreira EBTT. Ela lembra que um dos compromissos da atual diretoria é trazer ao debate temas que impactam na vida de todos e todas.
Durante o evento de quarta-feira, o assessor jurídico do Sinasefe SM, Heverton Padilha, ressaltou que é possível concluir preliminarmente que as propostas legislativas do GT da Reforma Administrativa, embora apresentadas sob o discurso de modernização e meritocracia, configuram um ataque sistemático às garantias constitucionais do serviço público. Na perspectiva trazida pelo advogado, a proposição gera efeitos como:
- Enfraquecimento da estabilidade;
- Substituição do concurso público por contratações precárias;
- Rebaixamento das condições salariais e de carreira;
- Centralização decisória e restrição à autonomia administrativa.
Conforme a nota elaborada pelo jurídico, as medidas da forma como estão postas pelo grupo parlamentar representam risco real à prestação universal, contínua e impessoal dos serviços públicos, e comprometem a atratividade, a segurança jurídica e o equilíbrio federativo da Administração Pública.

Heverton Padilha destaca que a proposição dos deputados está configurada em três tipos de projetos:
- Uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) – com alterações substanciais no art. 37 da Constituição Federal e impactos diretos no Regime Jurídico Único (RJU) dos servidores públicos;
- Um Projeto de Lei Complementar (PLP) – que regulamenta o art. 41 da CF/1988, com foco em avaliação de desempenho e gestão orçamentária por resultados;
- Um Projeto de Lei Ordinária (PL) – que institui o denominado “Marco Legal da Administração Pública”.
Confira a seguir a síntese dos efeitos das três propostas concatenadas:
PEC – Reforma Constitucional do Art. 37 da CF/1988
A Proposta de Emenda Constitucional introduz alterações estruturais na organização do serviço público, dentre as quais destacam-se:
- Inserção da “gestão por resultados” como pilar constitucional, com previsão de bônus individualizado (até quatro vezes a remuneração) para ocupantes de cargos estratégicos, pagos em parcela única, fora do teto remuneratório, vinculado a metas e à efetividade do exercício durante todo o ano civil.
- Supressão de direitos históricos dos servidores, com vedação expressa de:
- Adicionais por tempo de serviço (anuênios, quinquênios);
- Licença-prêmio e licença-assiduidade;
- Promoção/progressão exclusivamente por tempo;
- Conversão em pecúnia de férias/licenças não gozadas.
- Parâmetros que devem uniformizar as carreiras públicas:
- Carreiras com no mínimo 20 níveis;
- Remuneração inicial limitada a 50% do topo;
- Tabela única de remuneração por ente federativo (União, Estados, DF e Municípios), com referência no salário mínimo e no teto remuneratório local.
Impactos Jurídicos:
- Grave afronta ao princípio da isonomia entre os poderes, e desrespeito à autonomia federativa e às especificidades setoriais.
- Fragilização do princípio da estabilidade (art. 41, CF), ao viabilizar sua relativização por critérios de desempenho.
- Potencial violação de cláusulas pétreas, notadamente quanto à separação de poderes, proteção a direitos adquiridos, aposentadoria, isonomia.
PLP – Lei Complementar da “Responsabilidade por Resultados”
Regulamenta o art. 41 da CF, que trata da estabilidade no serviço público, instituindo o modelo de avaliação por desempenho e criando novos instrumentos de planejamento e gestão:
- Acordos de Resultados firmados entre unidades administrativas e instâncias superiores, com relatórios de execução trimestrais.
- Instituição do SINAP – Sistema Nacional de Avaliação de Políticas Públicas, com comitê gestor, catálogo de políticas e banco de dados públicos.
- Avaliação de desempenho com impactos diretos na progressão funcional, no pagamento de bônus e na perda do cargo por insuficiência de desempenho (com previsão de regulamentação por leis específicas de cada ente federativo).
Impactos Jurídicos:
- Estabelece vinculação entre avaliação e orçamento público, configurando risco de condicionamento do direito à progressão ao cenário fiscal.
- Submete o exercício de funções públicas à lógica gerencial (sempre atrelada ao cumprimento de metas, sem muita clareza quanto aos critérios), que pode subverter o regime estatutário.
- Representa ameaça concreta à estabilidade funcional, especialmente diante da ausência de garantias processuais mínimas nos modelos de avaliação propostos (dificulta o exercício do contraditório)
PL – Projeto de Lei Ordinária do “Marco Legal da Administração Pública”

Visa instituir novas diretrizes para a organização administrativa, concursos e carreiras públicas:
- Criação do Programa de Gestão de Desempenho (PGD), inclusive para o teletrabalho, impondo:
- Responsabilização do servidor por infraestrutura;
- Proibição de residência fora do município de lotação;
- Exigência de 80% de carga horária presencial.
- Reestruturação de concursos públicos, condicionados a:
- Estudo de viabilidade de terceirização (Passa ser prioridade a contratação de terceirizados);
- Análise orçamentária e de força de trabalho;
- Estratégia de “execução indireta” preferencial. (dificulta a realização de concurso públicos pelos entes)
- Uniformização das carreiras públicas com:
- Vedação de progressão exclusivamente por tempo;
- Estabelecimento de um mínimo de 20 anos até o topo;
- Criação do COPAR – Conselho de Pareceres sobre Carreiras e Remuneração.
Impactos Jurídicos:
- Fragiliza o acesso por concurso público, contrariando o art. 37, II, da CF.
- Promove precarização institucionalizada, mediante ampliação da terceirização e de vínculos temporários.
- Compromete a isonomia e a meritocracia, substituindo o concurso por seleção discricionária e mecanismos de avaliação subjetiva.
A análise da assessoria também aponta os conflitos jurídicos e constitucionais da proposição parlamentar.
- Violação à estabilidade prevista no art. 41 da CF, especialmente ao vinculá-la a metas subjetivas e avaliações gerenciais com potencial uso político ou persecutório.
- Contrariedade ao art. 37, II e VIII da CF, ao dificultar e subverter o concurso público como via principal de ingresso no serviço público.
- Risco de afronta ao princípio federativo e à separação de poderes, ao centralizar diretrizes sobre carreira e remuneração em órgãos federais, afetando competências dos entes subnacionais e dos demais Poderes.
- Afetação de direitos adquiridos e expectativa legítima de servidores, com possíveis litígios administrativos e judiciais futuros.
Ao final de sua explanação, o advogado Heverton Padilha fez algumas recomendações, que destacamos a seguir:
- Rejeição integral das proposições legislativas até que seja promovido um amplo e democrático debate nacional sobre a estrutura do serviço público.
- Atuação institucional junto ao Congresso Nacional, com argumentação técnica e jurídica robusta, visando sensibilizar parlamentares sobre os riscos das propostas.
- Adoção de medidas judiciais preventivas, a depender da tramitação e do conteúdo final das proposições, por meio de ADIs, ADPFs ou mandados de segurança coletivos.
- Mobilização das entidades representativas e controle social, com apoio técnico de instituições acadêmicas e jurídicas.
Texto: Fritz Rivail com informações da assessoria jurídica
Fotos: Renato Seerig
